Há quem defenda as cotas para
negros como uma oportunidade para aqueles que sofreram com a descriminação e a
consequente exclusão social. Uma parcela da sociedade acredita na
equalização das oportunidades, outra, que o sistema só reforça o preconceito
racial. Debatido há muitos anos no Brasil, a igualdade racial é um tema
delicado e, aproveito este assunto para trazer a minha opinião sobre o
sistema de cotas nas universidades brasileiras.
Quatro quintos da
história do Brasil se deram sob regime escravocrata. A ONU (Organização das
Nações Unidas) estabeleceu a escravidão como crime de lesão a humanidade e,
mais do que isso, solicitou que os países buscassem medidas, mecanismos e
políticas públicas que pudessem, não apenas suavizar, mas também reparar esse
dano, que o Brasil inclusive é signatário. E por que o Brasil é signatário?
Porque a liberdade foi excluída, o direito ao corpo foi excluído, o direito a
dignidade foi excluído. As pessoas foram torturadas, estupradas, assassinadas,
ou seja, não tinham direito a vida. Quais são as consequências advindas desse
processo? É o que nós temos hoje. Por isso, que nós temos apenas 2,8% dos
empresários brasileiros sendo afro-descentes. Assim, como é necessário afirmarmos
que, quando nós estamos pleiteando a reparação, bem como afirmando que a
escravidão é um crime de lesão a humanidade, estamos dizendo que nós precisamos
corrigir esse crime que foi cometido.
Cabe ressaltar que,
qualquer pessoa sabe diferenciar o tipo de escravidão provocada pelas lutas
tribais africanas e pelo mercado negro que foi criado a partir da Europa,
particularmente de Portugal para as Américas. Mais do que isso, no Brasil a
mestiçagem tem sido utilizada quase sempre para negar a parte negra da
sociedade brasileira. A mestiçagem no Brasil é parte do fenômeno de
branqueamento, do qual o Gilberto Freyre foi um dos grandes defensores, ou
seja, aqueles que acreditavam que melhorar a raça brasileira significava
evidentemente retirar a parte negra existente na sociedade. Diga-se de
passagem, foram executadas políticas públicas de eugenia na década de 30 para
trazer uma migração europeia para o Brasil, no sentido de "melhorar as
condições sociais dentro da sociedade brasileira", porque os negros eram
portadores da desagregação racial. Tudo isso, nesse Brasil que tem uma
representação conservadora nos partidos da Direita, que lutam contra as cotas
nas universidades, contra o bolsa família, etc.
As cotas nas
universidades brasileiras possibilitam aos estudantes credores desse benefício,
sejam eles negros, pardos ou índios, igualdade de condições no mercado de
trabalho futuro. Antes disso, cabia a essa parcela da sociedade se contentar
com trabalhos focados na mão de obra braçal, como por exemplo: pedreiros,
jardineiros, empregadas domésticas, ferreiros e outros. A ideia desse benefício
é proporcionar aos cotistas a possibilidade de serem arquitetos, médicos,
engenheiros, professores, etc.
Pesquisando sobre a
parcela dos negros na política, tanto nos poderes Legislativo, Executivo e
Judiciário, me surpreendi com alguns dados. Há mais de um século depois da
existência do Supremo Tribunal Federal, nós só temos na casa um único negro: o
Ministro Joaquim Barbosa. Eu não consigo acreditar que seja por incompetência,
por incapacidade ou pela não vocação dos negros para o estudo. Por isso, temos
que admitir que a sociedade brasileira foi estruturada na base do racismo, onde
a riqueza produzida no Brasil é fruto da escravidão brasileira.
Outros dados interessantes
são sobre as universidades públicas brasileiras: 75% dos estudantes
pertencem as classes A e B e a maioria dos trabalhadores negros estão em
universidades privadas. O mecanismo do vestibular é falho, inclusive já foi
noticiado e comprovado por grandes emissoras, que essas provas não servem para
verificar a qualidade intelectual dos candidatos, e sim resolver o problema da
vaga na Universidade. Por isso, o que tem que ser defendido é o acesso as
universidades públicas no Brasil, de forma que, todos tenham direito
igualitário. Você não acha?